Outro dia de merda na delegacia. A 76ª DP, aqui em Niterói. Um formigueiro de desgraça, cheiro de mofo e café requentado. Vocês sabem como é, né? O tipo de lugar que suga a alma devagarinho, te transforma num cínico de carteirinha antes dos trinta. Eu sou Robert. Agente Robert para os otários que cruzam meu caminho aqui dentro. Faço meu trabalho. Bem pra caralho, diga-se de passagem. Prendo vagabundo, bato ponto, finjo que me importo com as papeladas que se acumulam na minha mesa como um monumento à burocracia inútil.
Mas hoje o ar está diferente. Mais pesado. Elétrico. Culpa dela, claro. Clara. A inspetora Clara Bastos. Entrou aqui há uns dois anos, transferida de alguma cidade do interior que nem me dei ao trabalho de decorar. Alta, morena, olhos que te cortam como navalha e um corpo que faz qualquer uniforme parecer alta costura. Profissional ao extremo aqui dentro. Friamente eficiente. Ninguém diria que por baixo daquela fachada de aço existe… bem, existe a Clara que eu conheço.
Nossa história? É antiga. Coisa de moleque, lá em Maricá. Primeiro beijo roubado atrás do colégio, mãos bobas no escurinho do cinema, promessas idiotas que a vida fez questão de atropelar. Perdemos contato, cada um foi lamber suas feridas em cantos diferentes do estado. E aí, ironia do caralho, o destino nos joga juntos de novo nesse buraco infecto. No começo, fingimos que nada existia. Profissionalismo. Colegas. Blá, blá, blá. Até que não deu mais pra segurar. Uma noite de plantão, um olhar mais demorado, uma desculpa qualquer pra ficar até mais tarde… e a porra toda explodiu.
Agora? Vivemos nesse jogo perigoso. Na delegacia, somos a dupla dinâmica, resolvendo casos, trocando informações com a mesma frieza que trocamos um bom dia protocolar. Ninguém desconfia. Ou fingem que não desconfiam. Foda-se eles. O que importa é o que acontece quando as luzes se apagam.
E hoje, depois de uma semana tensa fechando um caso de sequestro que quase deu merda, a tensão está no limite. Ela passou por mim no corredor agora há pouco, me entregou um relatório. Nossos dedos se roçaram por um milésimo de segundo. Ninguém viu. Mas eu senti. E sei que ela também sentiu. Aquele choque elétrico que só acontece entre nós.
***
O quarto do motel barato na Lapa cheira a cigarro velho e desinfetante. Sempre o mesmo lugar. Discreto. Anônimo. Perfeito pra nós. A luz amarelada do abajur de cabeceira mal ilumina o carpete manchado e as paredes descascadas. Um cenário digno de um filme B, mas é o nosso palco.
Clara está de costas pra mim, tirando a blusa do uniforme. Observo cada movimento. A disciplina dos músculos das costas, a curva suave da cintura. Ela é uma máquina de precisão no trabalho, mas aqui… aqui ela se desmonta. E eu adoro assistir.
Vocês estão me julgando, né? Achando que sou um obcecado doente. Talvez eu seja. Mas olhem pra ela. A maneira como o cabelo escuro cai sobre os ombros enquanto ela desabotoa a calça. A pele clara contrastando com a lingerie preta que ela sempre usa por baixo da farda. É uma obra de arte profana. E é toda minha. Pelo menos por algumas horas.
Ela se vira. Os olhos encontram os meus. Aquele olhar. Intenso. Faminto. A máscara de inspetora caiu. Agora é só a Clara. A minha Clara.
“Demorou,” ela diz, a voz rouca.
“O trânsito estava um inferno,” minto. A verdade é que precisei de uns minutos no carro pra me recompor. Pra me preparar pra isso. Pra ela.
Caminho até ela. Meus dedos traçam a linha da sua mandíbula. Ela fecha os olhos por um instante. Analiso cada detalhe. A pequena cicatriz quase invisível perto do lábio – lembrança de uma queda de bicicleta na infância, história que ela me contou numa noite regada a vinho barato. A respiração dela que fica mais rápida sob meu toque. Ela é um livro aberto pra mim. Eu leio cada página, cada capítulo escondido.
“Senti sua falta,” sussurro, mais pra mim do que pra ela.
Ela não responde com palavras. Apenas me puxa pela gola da camisa e me beija. Ferozmente. Como se quisesse arrancar alguma coisa de mim. Ou talvez se livrar de alguma coisa dentro dela. Nossas línguas se enroscam numa batalha antiga. Gosto de uísque e café na boca dela. Gosto de perigo.
Minhas mãos descem pelas suas costas, apertando sua bunda firme por cima da calça da farda. Ela geme contra minha boca. Esse som. É a minha droga. Ela sabe disso. Ela sempre sabe.
Ela se afasta um pouco, apenas o suficiente para desabotoar minha camisa. Os dedos dela são ágeis, precisos. Treinados para desarmar bombas ou… homens. Sorrio com o pensamento. Narcisista? Talvez. Mas quem não seria tendo uma mulher como essa aos seus pés?
“Tira,” ela ordena, puxando minha camisa.
Obedeço. Jogo a peça em qualquer canto do quarto imundo. Ela passa as mãos pelo meu peito. “Continua em forma, agente Robert.”
“Faço o possível, inspetora Bastos.”
Mantemos essa formalidade irônica mesmo aqui. É parte do nosso jogo doentio.
Ela se ajoelha. Sem pressa. Os olhos fixos nos meus. Desabotoa minha calça, desliza o zíper. O barulho ecoa no silêncio tenso do quarto. Minhas mãos vão para seus cabelos, mas ela me impede com um olhar.
“Hoje quem manda sou eu,” ela diz, a voz baixa, autoritária. A inspetora falando.
Ela tira meu pau pra fora da cueca. Ele já está duro como pedra. Ela o admira por um momento. Um sorriso mínimo brinca em seus lábios. Ela sabe o poder que tem. E eu deixo. Por enquanto.
Seus lábios roçam a ponta. Um arrepio percorre meu corpo. Ela me chupa devagar, torturantemente. A língua explorando cada veia, cada centímetro. Fecho os olhos. Tento me concentrar na sensação, mas minha mente não para. Analiso a técnica dela. A pressão. O ritmo. Comparo com outras. Nenhuma chega perto. Ela é única. Perfeita. Feita pra mim.
Abro os olhos. Ela me encara enquanto continua. Há um brilho diferente ali. Não é só desejo. É… desafio? Controle? Ela está me testando. Sempre me testando.
Seguro seus cabelos com força, ignorando seu aviso anterior. Puxo sua cabeça para mais perto, forçando-a a me engolir mais fundo. Ela engasga por um segundo, mas não para. Seus olhos faíscam. Ótimo. Gosto quando ela luta.
O ritmo acelera. Minhas mãos apertam seus cabelos. O quarto parece girar. Estou quase lá. Quase…
“Não,” digo, puxando-a para cima antes de gozar. “Minha vez.”
Ela me olha, ofegante, os lábios vermelhos e inchados. Há um misto de raiva e excitação em seus olhos. Perfeito.
A empurro para a cama velha que range sob seu peso. Tiro o resto de sua roupa com urgência. A calça, a lingerie preta. Ela fica ali, nua, exposta sob a luz fraca. Linda pra caralho.
“Deita,” ordeno.
Ela hesita por um segundo, depois obedece. A inspetora desapareceu de novo. Agora é só a Clara vulnerável. A que só eu conheço.
Subo na cama, posicionando-me entre suas pernas abertas. Beijo seu pescoço, a clavícula, desço para seus seios. Mordo levemente um mamilo e ela arqueia as costas, gemendo meu nome. Música para meus ouvidos.
Desço mais. Beijo sua barriga lisa, a cicatriz da cesárea quase invisível – outra história, outra noite, outra garrafa de vinho. Chego ao seu sexo. O cheiro dela me embriaga. Mergulho minha língua ali, explorando cada dobra, cada recesso. Ela se contorce, as mãos agarrando os lençóis puídos.
“Robert… por favor…”
Ignoro seus apelos. Continuo a tortura deliciosa. Chupo seu clitóris com avidez, usando meus dedos para abrir seus lábios, aprofundando minha invasão. Sinto suas contrações começando. Ela está perto. Muito perto.
Paro abruptamente. Ela abre os olhos, confusa, frustrada.
“O que foi?” ela pergunta, a voz embargada.
“Olha pra mim,” digo.
Ela obedece. Sustento seu olhar enquanto pego a camisinha na mesa de cabeceira e a coloco. Me posiciono sobre ela.
“Agora,” digo, e entro nela de uma só vez.
Ela grita, um som que é parte dor, parte prazer. Suas unhas cravam nas minhas costas. Começo a me mover. Devagar no início, depois mais rápido, mais fundo. Cada estocada é uma afirmação de posse. Ela é minha. Nesse quarto, nesse momento, ela é completamente minha.
Nossos corpos se chocam no ritmo frenético. O suor escorre, misturando-se. Os gemidos dela preenchem o quarto. O ranger da cama velha é nossa trilha sonora. Olho em seus olhos. Vejo o desejo, a entrega, mas também… algo mais. Uma sombra. Uma hesitação.
O que você está escondendo, Clara? Minha mente analítica não descansa nem agora. O que se passa por trás desses olhos tempestuosos?
Aumento o ritmo, ignorando a dúvida. Fodo-a com força, com raiva, com uma necessidade desesperada de apagar qualquer coisa que não seja eu. Ela responde com a mesma intensidade, cavalgando minhas estocadas, arranhando minhas costas, mordendo meu ombro.
Estamos perto. Sinto meu orgasmo subindo, uma onda quente e incontrolável. Ela também está chegando lá, seu corpo tremendo sob o meu.
“Goza comigo, Clara!” grito.
E então, juntos, explodimos. Um clímax violento, catártico, que nos deixa sem fôlego, tremendo, agarrados um ao outro como náufragos.
Caio ao lado dela, o peito arfando. O silêncio volta a preencher o quarto, quebrado apenas por nossas respirações irregulares. O cheiro de sexo e suor paira no ar.
Ela vira a cabeça e me olha. A sombra ainda está lá, nos seus olhos.
“Preciso te contar uma coisa, Robert,” ela diz, a voz baixa, quase inaudível.
Meu estômago gela. Lá vem merda. Sempre vem.
“O quê?” pergunto, já esperando o pior.
“Aquele relatório que te entreguei hoje… sobre o caso do sequestro…”
“O que tem ele?”
“Eu… eu omiti uma informação. Uma testemunha chave. Alguém que poderia complicar as coisas… pra você.”
Sento na cama, o pau mole esquecido entre as pernas. “Como assim, complicar pra mim? Do que caralho você tá falando, Clara?”
Ela desvia o olhar. “A testemunha viu seu carro perto do local do cativeiro. Na noite anterior ao resgate. Sozinho.”
O sangue some do meu rosto. Lembro daquela noite. Tinha ido até lá. Uma reconhecimento extra, não autorizado. Coisa minha. Narcisismo, talvez. Queria ter certeza de que meu plano era perfeito. Ninguém podia saber.
“E por que caralho você omitiu isso?” minha voz é um fio.
“Porque eu sei o que você fez, Robert,” ela finalmente me encara, e agora não há sombra, apenas uma frieza calculada que nunca vi antes. “Eu sei que você não estava só fazendo reconhecimento. Eu sei que você falou com os sequestradores. Fez um acordo.”
Paraliso. Como ela sabe? Impossível.
“Você está louca,” consigo dizer.
“Não,” ela balança a cabeça lentamente. “Eu não omiti a testemunha pra te proteger. Eu omiti pra ter isso.” Ela pega o celular na bolsa jogada no chão. Mexe por alguns segundos e me mostra a tela. Uma gravação de áudio.
*”…libera a garota sem um arranhão e eu garanto que vocês somem do mapa antes da polícia chegar. Ninguém vai procurar vocês. Palavra de policial.”* Minha voz. Inconfundível.
Sinto o chão sumir sob meus pés. Ela gravou nossa conversa no motel? Não… a voz no áudio… é de outra ligação. Uma que fiz com os bandidos.
“Como…?”
“Eu não sou só um rostinho bonito e um corpo gostoso, Robert,” ela diz, levantando-se da cama e começando a se vestir com uma calma assustadora. A inspetora está de volta. “Eu sou uma boa policial. E desconfiei de você desde o início desse caso. Plantei uma escuta no seu carro.”
Filha da puta. A porra da filha da puta.
“Por quê?” consigo perguntar, a garganta seca.
“Porque eu cansei de ser a outra. Cansei de ser a inspetora fodida pelo agente fodão nos fundos da delegacia ou em motéis baratos. Eu quero mais. E você, Robert, com seu ego e seus esquemas sujos, vai me dar isso.”
“O que você quer?”
“Sua queda,” ela sorri, um sorriso frio que não alcança os olhos. “Vou entregar essa gravação para a corregedoria. Com a testemunha que eu convenientemente ‘encontrei’ hoje. Você vai ser expulso. Talvez preso. E eu? Eu vou assumir seu lugar. Vou mostrar pra todo mundo que a inspetora Bastos não é só uma bunda bonita.”
Ela termina de se vestir. O uniforme impecável de volta no lugar. A máscara de aço reinstalada.
“Você não pode fazer isso,” digo, mas minha voz não tem convicção.
“Posso. E vou.” Ela caminha até a porta. Para com a mão na maçaneta. “Ah, Robert…” ela se vira. “O sexo foi ótimo, como sempre. Pena que foi a última vez.”
E então ela sai, me deixando nu, fodido e completamente destruído naquele quarto de motel fedorento. O silêncio volta, pesado, opressor. Olho para as paredes descascadas, para o carpete manchado. O cenário perfeito para o fim da minha carreira de merda.
Rio. Um riso seco, sem humor. A ironia. Sempre a porra da ironia. Fui traído pela única mulher que achei que entendia. Pela única que achei que era minha.
Vocês devem estar rindo da minha cara agora, né? O agente fodão, o narcisista, derrubado por uma buceta. Clichê. Mas a vida é assim mesmo. Um clichê fodido atrás do outro.
Pego um cigarro amassado do bolso da minha calça jogada no chão. Acendo. A fumaça enche meus pulmões, mas não alivia a dor no peito. É o gosto da derrota. Cinzas na boca. Cinzas na farda.
Foda-se a Clara. Foda-se a corregedoria. Foda-se tudo.
Ainda tenho cartas na manga. Ela não é a única que sabe jogar sujo nessa cidade de merda. Ela pode ter ganhado essa batalha. Mas a guerra, meus caros… a guerra está longe de acabar.